terça-feira, 30 de junho de 2015

KING EDGAR HOTEL - Onde medos e horrores se revelam

Amanhã, FÉRIAS! E hoje, ao chegar do trabalho... SURPRESA! Chegaram os livros da coletânea que participei "KING EDGAR HOTEL - Onde medos e horrores se revelam"1, da Andross Editora2, o livro teve como organizadores Lara Luft3 e Alfer Medeiros4. Das coletâneas de terror que já li é sem sombra de dúvida uma das melhores, senão a melhor, não é porque tem um conto meu, mas realmente é fantástica! Até porque os contos são de certa forma interligados. O título do meu é: "Quarto 14: Propostas e consequências".

Sinopse:

"Você se hospedaria em um antigo hotel onde a camareira não tem braços, o mensageiro não tem olhos e o recepcionista aparenta ter idades distintas dependendo da hora do dia? Você ousaria pernoitar em um lugar cujo regulamento interno é estranhamente diferente de tudo o que você já viu? Muitos mistérios rondam o King Edgar Hotel. Fique à vontade para visitar os 21 andares deste lugar, que é a expiação dos pecados para uns, o inferno para outros e uma lembrança macabra para todos os que por ele passaram".


1. MEDEIROS, Alfer & LUFT, Lara (Org.). KING EDGAR HOTEL - Onde medos e horrores se revelam. São Paulo: Andross Editora, 2015. 530 p. ISBN: 978-85-99267-84-4.
2. ANDOSS EDITORA - Facebook. Disponível em: <https://www.facebook.com/androsseditora?fref=nf> Acesso em: 30 jun 2015.
3. ESCRITORALARALUFT - Facebook. Disponível em: <https://www.facebook.com/escritoralaraluft?fref=ts> Acesso em 30 jun 2015.
4. ALFER MEDEIROS - Facebook. Disponível em: <https://www.facebook.com/alfer.medeiros?fref=ts> Acesso em: 30 jun 2015.

domingo, 28 de junho de 2015

Fumetti - O Melhor dos Quadrinhos Italianos

Nas aos sebos sempre tem a possibilidade de encontrar algo legal, e na última vez encontrei da Editora Globo1, publicado em novembro de 1993, durante a 2ª Bienal de Quadrinhos do Rio de Janeiro2, 3 a BD "Fumetti - O Melhor dos Quadrinhos Italianos"4, projeto editorial de Leandro Luigi Del Manto5, que inicia com uma entrevista de Leandro com Sergio Bonelli6 (02/12/1932 - 26/06/2011) - "Uma Aventura nos Quadrinhos", em 17 de junho de 1993, em Milão - Italia. Meio que era uma apresentação dos principais títulos da Sergio Bonelli Editore7: Tex, Mister No, Martin Mystère, Dylan Dog, Nick Raider e Nathan Nerver. Uma edição especial sem dúvida.


1. EDITORA GLOBO. Disponível em: <http://passoapasso.editoraglobo.com.br/> Acesso em: 28 jun 2015.
2. VITTA, Vitória; NETTO, Gabriela; CARVALHO, Mayara; ROSA, Rodrigo. AGMET. Evolução das Histórias em Quadrinhos. Postado em: 26 mai 2014. Disponível em: <http://agemt.org/?p=4249> Acesso em: 28 jun 2015.
3. WIKIPÉDIA. Bienal Internacional de Quadrinhos. Atualizado em: 20 mai 2014. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Bienal_Internacional_de_Quadrinhos> Acesso em: 28 jun 2015.
4. EDITORA GLOBO. Fumetti - O melhor dos quadrinhos italianos. Tradução: Fulvio Giannella Júnior. São Paulo: Editora Globo, nov 1993.
5. LINKEDIN. Leandro Luigi Del Manto. Disponível em: <https://br.linkedin.com/pub/leandro-luigi-del-manto/96/77a/59> Acesso em: 28 jun 2015.
6. ASSIS, Erico - OMELETE. Sergio Bonelli - Morre o maior nome dos quadrinhos italianos: Escritor e editor era presidente da editora que levava seu nome. Postado em: 26 set 2011. Disponível em: <http://omelete.uol.com.br/quadrinhos/noticia/sergio-bonelli-morre-o-maior-nome-dos-quadrinhos-italianos/> Acesso em: 28 jun 2015.
7. SERGIO BONELLI EDITORE. Personaggi. Disponível em: <http://www.sergiobonelli.it/sezioni/96/personaggi> Acesso em: 28 jun 2015.

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Sandman: Noites Sem Fim

Em "Sandman: Noites sem fim"1, Neil Gaiman2, nos reapresenta os Perpétuos3, em histórias instigantes e maravilhosas, desenhadas por grandes artistas: P. Craig Russel, Lovern Kindzierski, Milo Manara, Miguelanxo Prado, Barron Storey, Dave McKean, Bill Sienkiewicz, Glenn Fabry, Chris Chuckry e Frank Quitely. Todas com uma faceta surpreendente dos irmãos do Sonhar! Como não se emocionar.


1. GAIMAN, Neil. Sandman: Noites sem fim. 1ª ed. Ilustrado por: P. Craig Russel, Lovern Kindzierski, Milo Manara, Miguelanxo Prado, Barron Storey, Dave McKean, Bill Sienkiewicz, Glenn Fabry, Chris Chuckry e Frank QuitelyTradução: Jotapê Martins, Fabiano Denardi. Barueri, SP: Panini Books, 2014, ISBN: 978-85-8368-070-3.
2. NEIL GAIMAN, Disponível em: <http://www.neilgaiman.com/> Acesso em: 25 jun 2015.
3. CESAR, Antônio. SALAZERO. Os Perpétuos de Neil Gaiman. Postado em: 06 mai, 2010. Disponível em: <http://salazero.blogspot.com.br/2010/06/os-perpetuos-de-neil-gaiman.html> cesso em 25 jun 2015.

HDHEL

HDHEL
Irineu Lima de Albuquerque
I
            Estavam agonizando de dor deitados no chão, totalmente nus. Nas costas duas marcas e sangue. Não possuíam nenhum pelo no corpo, nem mesmo sobrancelhas, imaculados, sem nunca ter sofrido uma doença. Era a primeira vez que aquele sentimento de agonia os martirizava. Pobres seres caídos.
            – Hdhel! – Gritou Maadel – Que sensação martirizante é essa?
            – Eles chamam de dor, já sabia que eles eram frágeis, que se quebravam com facilidade e sofriam de sensações de todos os tipos, mas nunca imaginei que fosse tão intenso. – Nesse instante Maadel não suportando desmaia – Maadel! Fale comigo!
            Numa sensação angustiante, Hdhel levanta, com sua nudez antes inocente exposta. Demonstrando certa dificuldade para se equilibrar, pela falta das asas extirpadas. Por qual motivo estavam caídos? A memória o traía. Lembrava-se de uma guerra no paraíso. Um lugar totalmente imaculado, que viu o sangue de irmãos. Seres imortais que mesmo retalhados ainda tinham consciência do universo ao redor. E o Grande? Onde estará?
            Hdhel chega junto de Maadel e o ampara, colocando a cabeça do amigo em suas pernas. Nesse instante se da conta do frio daquela noite, e sente a necessidade de aquecimento. Abraça forte o amigo junto ao peito e sente o calor que antes não existia, a pulsação da circulação e o peito arfante com a respiração. Tudo era novidade. Viviam literalmente pela primeira vez!
            – Hdhel... Companheiro... O que faremos agora?
            – Eles nos descobriram amigo! Jogaram-nos no fosso sem fim. Que pelo visto não era assim sem fim. Pois aqui estamos nós, nesse lugar estranho, provavelmente é a Terra, onde vivem os homens. Precisamos caminhar agora e descobrir um lugar para descansarmos. Não podemos ficar aqui.
            – Falaste corretamente agora. Pois nunca antes senti tais coisas. Meu corpo todo parece doer. Tu já reparaste no céu? As estrelas agora parecem tão distantes.
            – Observastes aquele caminho escuro? Vindo daquele lado para cá? Vamos segui-lo. Quem sabe possamos encontrar auxílio. – Comentou Hdhel. – Levanta-te amigo. Apoia-te em meus ombros caso não consigas andar.
            ­– Não te preocupes Hdhel, tenho a mesma força que tu tens.
            – Que força? Não temos mais nem nossas asas! E aqui tudo é diferente. A realidade segue outro curso. Mas é isso. Se tu achas que podes caminhar, põe-te de pé e segue-me.
            E foram os dois naquela estrada. A noite estava limpa e no baixo horizonte a lua brilhava pálida. Já era por volta das três da manhã quando avistaram uma casa, e exaustos desabaram na varanda em sono, pela primeira vez em suas existências.

II
            Naquela manhã de domingo Luiza com uma sensação de cansaço e um peso nas costas de anos de trabalho sem fio, foi até o quarto de Carlinhos e conferiu seu sono, ainda eram cinco e quarenta e cinco da manhã. Seu filho dormia tranquilo apesar dos acontecimentos dos últimos dias. Marcelo, seu marido, envolveu-se num acidente de trânsito. Um inconsequente dirigindo embriagado avançou de uma estrada secundária sem se preocupar com outros automóveis. Entrou na estrada principal a quase cem por hora, derrapando na pista. Quando o carro de João Carlos vinha a oitenta na estrada, e avistou aquela manobra, tentou então desviar jogando o carro para o lado oposto. Entretanto, o carro tombou e capotou várias vezes para fora da estrada. Por sorte João estava com o cinto de segurança. O imprudente, um quilômetro à frente, chocou-se numa árvore ao sair da estrada. Foi projetado para o para-brisa e pereceu imediatamente.
            Um carro logo atrás parou e seus ocupantes foram acudir João. Apreensivos, não tocaram nele.
            – Meu, liga ai para pedir ajuda. – Retrucou Antônio – O cara precisa sair dali, “vamo” tirar ele.
            – “Tu é doido!” Nunca viu na TV os “homi” falarem para não mexer em gente que sofre acidente, Mano. Vou ligar pro Paim e ver o que ele diz.
            Lucas o segundo irmão e mais velho, liga para o pai e conta que a três quilômetros de casa aconteceu um acidente, e que uma pessoa necessitava de ajuda. O pai, Seu Joaquim pede para que eles fiquem tranquilos, e informa que ligaria para o hospital da cidade e solicitaria uma ambulância e também ligaria para a delegacia.
– Mas atenção! De forma alguma mexam na pessoa no carro! Você viu vazamento de gasolina?
– Não, Paim – Respondeu Lucas.
– Certo, pois fiquem aí que eu já vou chegando. ­– Dez minutos depois Seu Joaquim chega ao local muito apreensivo. – Meus filhos, a única ambulância disponível para essa região está atendendo outro caso cabeludo. E na delegacia informaram que estavam enviando uma viatura. – Aproximaram-se do carro de João. O carro estava capotado e esse estava pendurado no banco, preso pelo cinto de segurança.
– O cara “tá” vivo Paim! – Gritou Antônio.
            Olharam aquele quadro e Seu Joaquim ponderou a respeito mentalmente. Precisaria capitular corretamente, não queria arriscar causar um problema mais grave àquela pessoa, por uma ajuda imprudente. Entretanto, caso o apoio demorasse a chegar teriam que fazer alguma coisa urgente. Era um homem vivido e já viu muita gente morrer por atendimento imprudente
            O tempo passava e nenhuma ajuda chegava. Decidiram agir. Seu Joaquim era dono de uma madeireira e sempre tinha alguma peça de madeira no carro. Pegou uma lamina de compensado de quatro centímetros e com muito cuidado, os três soltaram o cinto de segurança e apoiaram com o máximo cuidado possível aquele acidentado.
            – Como foi que isso aconteceu garotos? – Muito nervoso perguntou.
            – “Outro carro cortou ele na estrada”, vi tudo, e no desespero para desviar, acabou capotando.  – Pondera Antônio.
            Suspenderam a lâmina de madeira para colocar atrás do carro, e nessa hora, gemendo de dor, João Carlos diz um nome – Maria Luiza!
            – Calmo companheiro! Você sabe o que aconteceu? Sabe que dia é hoje? – Pergunta Seu Joaquim para testar o nível de consciência daquele homem.
            – Segunda-feira. Ah! Que dor! O que aconteceu?
            – Fique tranquilo, vamos cuidar de você. Procure não se mexer. Qual seu nome? Tem alguém que a gente possa chamar?
            – Sim, minha esposa, Luiza. Mas ela não deve está em casa. Levou nosso filho para a escola. Meu nome é Carlos. Quanto tempo fiquei desacordado?
            – Já tem quase duas horas que o carro tombou e somente agora você despertou. Replica Lucas. – Passa das dez agora.
            Não adiantava mais nada. Carlos perdera a consciência. Então eles tocaram dali para o hospital da cidade. No caminho ligaram para a delegacia informando que estavam transportando uma pessoa, disseram o nome de Carlos e da esposa, mas não sabiam mais nada, pois ele voltara a perder a consciência. Então solicitou ao delegado que ligasse ao hospital que se preparassem para recebê-los para os devidos cuidados. Lá chegando, uma equipe de pronto-atendimento os recebeu e encaminharam Carlos à emergência.
            Através dos documentos de Carlos, o delegado verificou o nome completo e o endereço e ligou para Luiza. Quarenta e cinco minutos depois, Luiza entrou no hospital, e na recepção indicaram-na as pessoas que trouxeram seu marido. – “Pelamordedeus” o que aconteceu? Perguntou se dirigindo ao homem mais velho dos três, Seu Joaquim.
            Seu Joaquim, um homem em torno dos sessenta anos, levanta e observa o desespero de Luiza, que era uma bela mulher. Cabelos negros, assim como os olhos, pele muito branca, e aparentava ter menos de trinta anos. Estava trajando uma calça jeans e uma blusa branca, e como de praxe naquela região, um par de botas até a altura dos joelhos. – Meus filhos encontraram seu marido capotado na estrada, e me chamaram para ajudar. O carro dele foi desviar de outro. Que já descobrimos, através do delegado, que pouco a frente bateu e o ocupante morreu. Estava embriagado.
            Luiza tombou, mas foi amparada por Lucas. Que a colocou num sofá da recepção do hospital. – Ajudem aqui! A moça desmaiou. – Uma enfermeira correu e observou os sinais. E constatou que ela estava bem. Usou uma substância de cheiro forte que despertou Luiza.
– João Carlos! – Gritou Luiza ao despertar. – Por favor, não me escondam nada, meu marido? Como ele está?
– Moça, o “homi” que trouxemos está sendo atendido. Eles estão lá dentro a mais de duas horas.
Os minutos passavam lentamente. Seu Joaquim e os filhos resolveram ficar para amparar Luiza. Ela contou que vive com o marido João Carlos e o filho Carlinhos, e que a família dela era de Salvador - BA e mudaram-se para Juazeiro – CE há menos de um ano, onde Antônio Carlos nasceu, mas com a morte dos pais não tinha mais ninguém, Carlos era filho único. Por esse motivo naquele momento, Seu Joaquim amparara Luiza.
Meia hora depois, um médico veio à recepção procurando familiares do paciente João Carlos. – Desculpem, foram vocês que trouxeram a vítima do acidente na estrada?
– Doutor, fomos nós que trouxemos. – Responde Seu Joaquim. – Mas essa senhora é a esposa do rapaz.
– Ah! Sim! – Titubeia o médico – Desculpe (pigarro), lamentamos muito senhora, fizemos tudo possível, a-a-apesar de o paciente ter chegado consciente, pois, pois não quebrou nenhum osso, nem tinha sangramento. Todavia, ele teve uma parada respiratória, fizemos os procedimentos de ressuscitamento e ele estabilizou alguns minutos. Mas teve um infarto do miocárdio. No exame descobrimos que ele tinha uma grande área do músculo cardíaco afetada. Mesmo que não tivesse sofrido acidente, teria tido um infarto.
– Meu marido morreu? – Luiza desfaleceu amparada por Seu Joaquim.
– Rápido enfermeira traga uma maca. – Luiza apresentou queda de pressão e com a notícia da morte de João Carlos entrou em choque. Despertou após alguns minutos ainda agitada e comentou do filho, e que precisava pegá-lo na creche. Provavelmente já teriam tentado ligar para ela.
– Dona Luiza! – Disse Seu Joaquim. – Não se preocupe, sinto-me na obrigação de ajudá-la nesse momento. Eu a levo até a creche para pegar o menino, ele fica na minha casa com minha esposa e depois retornamos ao hospital para as providências necessárias.
– Não sei nem como agradecer ao senhor. Nem sei o seu nome ainda! – Fala Luiza tremendo.
– Sou Joaquim, e esses são meus filhos Lucas e Antônio, foram eles que testemunharam todo o ocorrido e ligaram para mim. E então trouxemos seu marido para o hospital. Mas quem poderia imaginar que ele teria um problema no coração?! Não sofreu nada no acidente.
  
III
Luiza saiu do quarto de Carlinhos se espreguiçando, a passos lentos vai a cozinha pegar um balde, no qual pretendia tirar leite de umas das vaquinhas que eles adquiriram tão logo chegaram à cidade e foram se instalar naquele pequeno sítio. No último ano teria sido só alegria. João Carlos ganhará num golpe de sorte na Bahia, um prêmio da loteria. Bem verdade que foi com outros cinco, mas o premio era bom e com os planos que já possuíam de ir morar no Ceará, terra dos seus pais, com certeza ajudou e muito. Entretanto, os últimos dias foram muito pesados. Aquele domingo era o sexto dia após a morte de Carlos. Luiza mantinha-se forte, pois não poderia desabar de forma alguma. Tinha o Carlinhos, que mais do que nunca precisava de seu apoio.
Eram seis horas e o dia já ia clareando. Luiza vestia um pijama amarelo, uma calça comprida e uma camiseta. Encaminhou-se para a porta com o balde para ordenhar sua vaquinha. Ao abrir a porta, deparou-se com uma cena inusitada. Dois homens nus em sua varanda. No início tomou um susto e pensou se tratar de safadeza. Um estava deitado de costas e o outro de lado, e ambos estavam sujos, com escoriações e havia sangue nas costas. – Será que desovaram cadáveres na minha varanda? – Pensa Luiza – Depois de tudo que estamos sofrendo nos últimos dias! – Mas logo observou movimento e viu que os dois respiravam. Deu passos atrás e foi até o quarto. Retornou em seguida com um lençol e cobriu os dois, que não despertaram e pretendia ligar para a delegacia. Mas pensou melhor.
– Ei! Você dois. – Os dois despertaram assustados expondo suas nudezes. Luiza envergonhada vira o rosto. – Por favor, vocês poderiam se cobrir? – Sem entender, Hdhel e Maadel, nossos já apresentados caídos (de algum lugar), encararam Luiza e a mesma repetiu o pedido que se cobrissem com o pano. Somente então Hdhel entendeu e puxou o lençol cobrindo-os.
– O que aconteceu a vocês? Por que estão na minha varanda? E por que estão machucados? Foi um acidente? Precisam de ajuda?
– Eu sou Hdhel e esse é Maadel, nós somos a... – Calou-se, pois não sabia como reagiria a mulher. – Nós somos de outro lugar e precisamos de ajuda. Não sabemos onde estamos.
– Como não sabem? Aqui é Juazeiro do Ceará. Afinal! Como chegaram aqui se não sabem onde estão? Vocês foram sequestrados? – Luiza ficou desconfiada.
– Mais ou menos isso, que dizer, é complicado comentar a respeito. – Retrucou Hdhel.
– E os machucados? Você tem a mesma escoriação nas costas. Foram agredidos?
– Também, mas primeiro quero pedir desculpas por nossa situação, assim sem roupas na sua casa. Não era nossa intenção. A senhora não teria roupas para nos emprestar?
– Meu marido faleceu a pouco e certamente alguma roupa dele deve servir em vocês. – Luiza entrou e fechou a porta. Caminhou até o quarto. Dali a alguns minutos retornou e entregou algumas peças de roupa para o dois. – Vocês podem se trocar ali atrás, tem um banheiro, mas antes se virem de costas para mim, para limpar suas escoriações. Suavemente com o estojo de primeiros socorros, Luiza, acocorada, vai limpando os machucados das costas de Hdhel e depois de Maadel. – Que estranho, o machucado de vocês é exatamente igual. – Rindo Luiza fala: – Vocês não seriam anjos do céu, não é mesmo?
Maadel, mais inocente, arregala os olhos encarando Luiza e disse: – Como você sabe? Já tinha visto outros anjos? – Luiza se assusta e cai sentada. Hdhel com olhar de reprovação encara Maadel. – Irmão, mas ela sabe. Viu nossos machucados. – Luiza olha um e o outro, agora já lacrimejando.
– Oh meu Deus! Um dia já vi meu Anjo da Guarda, mas ele tinha lindas asas e vocês não têm mais elas! O que aconteceu? Vocês não são mais anjos?
– Calma senhora, não tire conclusões precipitadas. – Comentou Hdhel.
– Eu sabia que algo era estranho. Oh meu Deus! Por favor, vocês vieram em missão? Eu sou católica e sempre acreditei em vocês. Foi por Carlinhos?
– Como já dissemos, é complicado. Deixe-nos colocar as roupas. Depois conversamos. – De forma desengonçada os dois levantaram se cobrindo e caminharam para parte detrás da casa.


IV
– Maadel, você já consegue lembrar de tudo o que aconteceu? – Pergunta Hdhel
– Parcialmente irmão. Lembro-me de ter sido agarrado a força como você.
– Exatamente! Eles nos arrancaram as asas! Eram muitos! E os que tinham forma de animais eram os mais violentos. Jogaram nossas asas no fosso sem fim e em seguida nos jogaram. Não queriam sujar as mãos com nossa destruição. Era mais fácil se livrarem das evidências. No último instante antes eu peguei sua mão.
 – Sim, eu me lembro disso. Você segurou minha mão. Por quê?
– Assim quando estivéssemos caindo não nos separaríamos. Mas a velocidade da queda era muito grande e não sei dizer por quanto tempo aquilo aconteceu. Apenas sei que no último instante você estava quase soltando minha mão e de repente senti um forte calor, uma luz nos envolveu e fomos arrebatados para o nada, e quando dei por mim, estávamos caídos naquele local.
– Puxa Hdhel! É verdade! Não tinha me dado conta disso. Aquele calor envolvente e subitamente arrebatado. Você acha que foi obra Dele? O Nosso Senhor? Mas se foi por que intercedeu por nós?
– Não sei. Mas para Ele tudo é possível! E se tudo sabe, tudo ver, tudo está escrito, tudo pode fazer. Então deve ter uma razão para tudo isso. Quando fui convocado para me infiltrar nas hostes guerreiras e investigar uma possível dissidência, nunca poderia imaginar que acabaria assim. Portanto, deve realmente existir uma razão e precisamos buscar as respostas e talvez cumprir uma missão. E pode ter certeza! Nossa presença aqui não passou despercebida. Temos que descobrir como agir. A qualquer momento poderemos ser atacados. Mas vamos! Termine de colocar essas roupas. Não entendo essa necessidade de estarem sempre cobertos dos humanos?! Nossas vestes são usadas apenas nas ocasiões especiais, nas missões e na hora da luta.
Retornando para a varanda não encontram Luiza. E percebem a porta aberta. Cautelosamente avançam para o interior da casa. Ao se acostumarem com a pouca luminosidade interna, percebem Luiza ajoelhada junto a um altar. Uma cruz na parede, e um pequeno altar de mármore na parede, com algumas rosas e uma vela acesa. Uma imagem de Nossa Senhora Aparecida e outra do Padre Cícero. Luiza estava de cabeça baixa orando e chorando. Agradecendo a Deus a graça de ter dois anjos na sua casa. E pedindo forças para realizar qualquer que fosse sua missão. Pois aqueles dois seres celestiais não tinham suas asas e isso poderia ser um péssimo sinal.
– Senhora Luiza! – Chamou Hdhel. – Está tudo bem? Precisa de alguma coisa?
– Nunca imaginei que seria agraciada com a presença de algum anjo novamente. Mesmo vocês sendo anjos caídos! Há alguns anos logo após terminar minha graduação em Agronomia, pretendia realizar uma viagem a Paris, para conhecer e descansar um pouco. Estava no Rio de Janeiro. Já a caminho do aeroporto. Quando subitamente na frente do táxi passa uma bicicleta e o ciclista é atropelado. Ele tinha quebrado a perna e estava muito machucado. Mesmo sabendo que perderia o voo, pedi ao motorista de táxi para colocá-lo no carro e seguir para um hospital. Ficamos uma hora e meia esperando para ele ser atendido. Após o atendimento constatei que não daria mais tempo de ir ao aeroporto. O rapaz saiu numa cadeira de rodas.
– Desculpe-me novamente garoto. – Falou o motorista do táxi. – Não o vi chegar. Foi tudo tão rápido. Apenas vi você caindo.
– Não se preocupem! Não vou cobrar nada de vocês. Estou bem. – Falou o jovem sorrindo.
– Posso fazer alguma coisa por você? Terei prazer em deixá-lo em casa. Pago a corrida do táxi. – Eu falei.
– Muita bondade de vocês dois. O senhor poderia empurrar essa cadeira até o banheiro? – Pediu o rapaz.
O motorista do táxi o levou e o deixou entrar. Passaram-se alguns minutos e nada dele retornar. O motorista resolveu ir até o banheiro. Voltou e disse que o rapaz não estava mais lá. – Como assim? Ele não poderia ter sumido. Estava com a perna no gesso. – Eu disse e fui dar uma busca em algumas salas do hospital e perguntando se alguém teria visto o rapaz, que trajava uma roupa de ciclista colorida, dessas bem colocadas no corpo e capacete na mão. Não o localizando, por fim, pedi que o taxista me levasse para casa. Saindo do hospital vi o rapaz em cima da bicicleta, que não estava nem amassada, sem o gesso e que sem mais nem menos emitiu uma luz muito forte, e juro que vi assas nas costas dele. E simplesmente desapareceu. Ao chegar a casa, fiquei sabendo que três horas e meia depois, o avião que partiu do Rio de Janeiro com destino a Paris, havia caído no Oceano Atlântico. O que me levou a concluir que um anjo me salvou, impedindo que embarcasse naquele voo.
– Depois desse episódio passei a me interessar mais por anjos. Lendo e buscando tudo que podia. Descobri que o nome do meu anjo da guarda é Laoviah, relacionado a data de meu nascimento, que é 16 de janeiro de 1984. – Comentou Luiza.
– Meu grande Lorde e Senhor! – Exclamou Maadel. – Nesse dia você foi minha missão! Agora estou lembrando! Aquele anjo era eu. Você ver Hdhel! Isso é um sinal!
– Não é possível! – Replicou Luiza. – O seu nome não é Laoviah! E você tinha cabelos...
– Claro que é possível senhora. Afinal, como os humanos poderiam saber o nome de algum anjo? É bem verdade que cada anjo pode ter muitos nomes, ou nenhum. Deve ter sido obra de algum anjo brincalhão essa dos humanos nos darem nomes. Ou então pessoas que querem se aproveitar da inocência alheia. Os únicos anjos cujos nomes são conhecidos são aqueles que estão nos Livros Sagrados. – Explicou Hdhel. – E quanto à aparência nós podemos nos transmutar e assumir a aparência que seja necessária para qualquer ação. Nomes são poderosos. De posse do nome muita coisa pode ser realizada. E outro detalhe, parte da pronuncia dos nossos nomes se dá a uma frequência muito alta, os ouvidos humanos não conseguem captar por inteiro. Ou seja, a forma como nos chama não é exatamente como pronunciamos nossos nomes para você.
– Agora vocês me deixaram de boca aberta. Que outros poderes vocês possuem? – Falou Luiza, já caindo no sofá da sala.
– Bom! No Infinito Eterno o tempo não é linear. Um determinado evento tanto pode acontecer no passado, presente ou futuro. Depende da perspectiva. – Respondeu Hdhel.
– Isso mesmo senhora. Quanto ao evento do passado, no qual eu fui participante direto [pausa] confesso que o natural das coisas seria que tivesse embarcado naquele voo e provavelmente teria morrido, lamento dizer isso assim. Mas houve quebra do fluxo temporal. Uma ordem foi expedida e a missão foi executada. Na época não fez nenhum sentido, pois qual significado no contínuo tempo teria aquela ação. A resposta veio agora. Três anos depois do ocorrido. E aqui estamos nós reunidos de novo. Eu o anjo que providenciou a ação de salvá-la, usufruindo de sua hospitalidade. Certamente alguma coisa mais virá. Apenas nos resta esperar. – Cogitou Maadel.
– E para mim só me resta rezar e pedir a Deus discernimento para entender as Suas ações! Como diz o ditado: “Deus escreve certo por linhas tortas”. – Ponderou Luiza.
­– Certamente, podemos encontrar no Livro Sagrado: “Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis os seus caminhos!”[1] Isso só prova que a vontade Dele é plena. E Ele sabe de tudo antes que aconteça. E Ele não apenas escreve certo como também em linhas certas. Pois tudo que vem Dele é verdadeiro. Jesus disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai a não ser por mim.”[2] – Sábias palavras de Hdhel.
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No Infinito Superior, dimensão que costumamos chamar de céu, onde tudo é tranquilidade e o tempo não tem o menor razão de ser. Até mesmo porque o tempo é uma invenção da humanidade para justificar o ciclo da vida e da morte. Colocando cada estação, cada momento no seu devido lugar, a fim de entender e compreender melhor a realidade que vivemos. No Infinito Superior todos os instantes existem por si só. Pode-se tocar o passado com uma mão e o futuro com a outra, enquanto os pés ficam no tempo presente. Das ações podem ser observadas suas consequências assim que são realizadas, mas somente Deus pode alterar o fluxo dos eventos. Desta feita, seres incapazes de conviver com essa realidade chegam às raias da loucura. Liberte ali um ser humano, de pensamento linear, e sua realidade se desmorona como um castelo de cartas.
Nos recônditos mais distantes do Infinito Superior, nos assim chamados locais que ponteiam a periferia, a realidade se torna menos abstrata, e tudo é um pouco mais palpável. Ali, seres superiores tramam e conjecturam mudanças.
– Caríssimo Jahel, precisamos tomar medidas severas. De alguma forma Hdhel e Maadel, que foram jogados no fosso sem fim, onde o tempo e o espaço não existem, desvencilharam-se desse destino cruel. E materializaram-se na Terra. Isso pode prejudicar nossos planos de assumirmos o poder de nossas hostes. Uma vez que a queda dos arcanjos que as comandam já está traçada e o empecilho que aquele dois estava causando parecia eliminado. Subitamente nossos mensageiros-espiões constataram essa alteração no fluxo temporal, aqueles dois foram arrebatados do fosso e jogados em outra realidade.
– O que pretendes fazer então Bessiel? Até que ponto conseguiremos esconder nossas ações? Como esses dois foram arrebatados? Uma energia desse tipo tem que partir de esferas superiores! Quem as manipulou?
– Não sabemos! Por enquanto! Mas iremos descobrir.
            Aqueles dois seres transmutados em pura luz debatiam suas ações inescrupulosas, em meio a um ambiente que supostamente apenas ideias do âmbito da paz e do amor deveriam ser concebidas. Eram criaturas belíssimas. Reluzentes por si só, imponentes seres do Infinito Superior. Servidores da justiça e serenidade. Entretanto, seus pensamentos eram de guerra e destruição. E seus intentos era a tomada do poder. Na qual, arcanjos comandantes ou por assim dizer, generais de hostes celestiais, teriam suas existências postas em cheque.
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            Luiza põe a mesa do café da manhã. Vai até a sala para falar com a dupla especial e convidá-los a desfrutar dos alimentos preparados. Leite fresco, queijo, um pão caseiro fresquinho, geleia preparada com frutas do pomar. Mas eles não se encontravam lá. Vai até a varanda e depara-se com os dois abaixo de uma árvore, olhando para a copa. Aproxima-se e os chama, mas não obtém resposta. Chega mais próxima e os observa de frente. Estavam com a cabeça erguida, como quem observava pássaros. Olhos vidrados. Então ela senta ao pé da árvore e fica admirada com aquela postura. Por cerca de dez minutos eles permanecem ali, pareciam nem piscar os olhos com uma expressão séria.
            – Vocês estavam fazendo o que? Pareciam hipnotizados. Estavam tão compenetrados e introspectivos. – pergunta Luiza.
            – Desculpe senhora! Estávamos aqui tentando escutar alguma coisa. Uma palavra que nos fizesse entender tudo que está acontecendo. – Comenta Hdhel.
            – Como uma palavra? Não entendi o que você disse. – Luiza fica interessada naquela situação. – Vocês estão querendo ouvir Deus?
            – Senhora Luiza, poucos de nós no Infinito Superior têm a chance de ver Nosso Deus, somente àqueles que são comandantes e os escolhidos. Entretanto, sua voz sempre nos chega a todo instante, para todos. Orientando e nos mostrando o caminho e forma correta de agir. Portanto, nunca estamos sós. Mas aqui não escutamos sua voz. E estamos perdidos, sem saber o que fazer. – Hdhel responde com uma tristeza profunda impressa em sua face.
            – Meu caro amigo. Antes de qualquer coisa, chame-me apenas de Luiza, nada de senhora. E depois, vocês não estão com fome? Venham provar o meu café da manhã. Depois vou ensiná-los a falar com Deus através da oração. Mas de qualquer forma, é assim que nós fazemos com a oração que foi nos ensinada por Jesus: “Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu reino; seja feita a tua vontade, assim na terra, como no céu. Dá-nos cada dia o nosso pão cotidiano; E perdoa-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos a qualquer que nos deve, e não os conduzas em tentação, mas livra-nos do mal”.[3] Com muita fé, recolhidos em oração, muitas vezes pedindo pela intervenção de um santo. Na Biblia, logo após o Pai Nosso, diz assim: ”Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á; Porque qualquer que pede recebe; e quem busca acha; e a quem bate abrir-se-lhe-á. E qual o pai de entre vós que, se o filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra? Ou, também, se lhe pedir peixe, lhe dará por peixe uma serpente? Ou, também, se lhe pedir um ovo, lhe dará um escorpião? Pois se vós, sendo maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais dará o Pai celestial o Espírito Santo àqueles que lho pedirem?”[4] Nós aqui sempre nos apegamos ao “Padim Ciço”, como diz o povo, o Padre Cícero. Tenho até uma imagem no meu pequeno altar. Mas eu prefiro orar à Maria. Especialmente a Nossa Senhora Aparecida. Já alcancei muitas graças, especialmente após a perda de meu marido. Nos últimos dias tenho me apegado bastante a Maria e venho pedindo forças para seguir em frente e criar o Carlinhos. Existe maior graça que receber anjos em casa? Venham! Vamos entrar e desfrutar desse prazer matinal. Afinal: “Bendizei ao Senhor, todos os seus anjos, valorosos em poder, que executais as suas ordens e lhe obedeceis à palavra.”[5]

V
            Hdhel e Maadel se admiraram e deliciaram-se com toda aquela comida deliciosa. Especialmente as geleias de frutas. Estavam conversando animadamente com Luiza. Contaram de suas ações e o ponto que culminou com a queda no fosso sem fim. Dessa forma Luiza ficou ciente que aqueles dois não eram exatamente anjos caídos. Aqueles seres sentados diante dela, vestindo as roupas de seu marido João Carlos eram seres especiais. Eles poderiam estar mentindo sobre tudo. Mas Luiza sentiu sinceridade nas palavras deles e algo dentro dela pedia para acolhê-los e ajuda-los. Eles foram traídos, sofreram agressões e foram jogados num poço sem fim. Mas com a Graça Divina foram arrebatados e jogados na Terra. Ali, em Juazeiro, no seu pequeno e simples sítio, onde agora vivia solitária com Carlinhos, seu filhinho de um pouco mais de um ano.
            Luiza também contou a eles os acontecimentos dos últimos dias. O acidente de João Carlos e sua súbita morte por infarto do miocárdio. João era um ótimo homem, grande marido e pai amantíssimo. Muito trabalhador e empenhado nas coisas do sítio. Depois que chegaram de Salvador, graças ao dinheiro que ganhou na loteria, montou uma empresa familiar, onde ele e Maria Luiza vendiam o que era produzido, ainda que em pequena escala. Toda produção de geleias e queijo coalho era vendida para comerciantes na cidade. E assim iam levando a vida naquela paz. Mas João Carlos, como a grande maioria dos homens, não ia regularmente ao médico, nos seus trinta e cinco anos, achava-se um super-homem e que viveria para sempre. Resultado, seu coração estava muito mal. Queixava-se de cansaço, mas dizia que era estresse. E quando se viu num situação grave, já era tarde demais.
            – Buaaaa.... – Maadel assustou-se com um som estridente. Era o Carlinho chorando.       – Não se preocupem. É meu bebê. Despertou e deve estar louco por colo e por seu mingau. É um garoto forte. Mamou até os sete meses e agora já come tudo com dezessete meses. Daqui a duas semanas no dia vinte de março ele completa dezoito meses. O “bichim” já estava começando a dizer “papa”. – Então Luiza desaba em choro.
Hdhel se aproxima e a abraça, e diz: – Nós sabemos que a vida não é o fim. Deus tem um propósito para tudo.
– É eu sei. Sempre acreditei nisso. E agora, mas do que nunca, sei que Ele nos ama e olha por nós. Vocês são a prova viva disso. – Então Luiza sai enxugando as lágrimas e vai ter com Carlinhos.
Alguns minutos depois ela retorna a sala com Carlinhos nos braços. – Olhem esse é meu menino. Nasceu aqui no Ceará. Eu já cheguei grávida. Quando conheci João Carlos em um mês estávamos juntos e casamos o civil. Quando viemos para cá há dois anos descobri que estava grávida. Então resolvemos casar na igreja antes que ele nascesse pra poder batizar. Fazer tudo certinho sabe!?
– É um menino forte e bonito. Certamente Nosso Lorde e Senhor tem uma missão para ele. Tenho certeza disso. Afinal, eu mesmo salvei a mãe dele. Quem sabe para que ele pudesse nascer!? – Conjecturou Maadel. Luiza sorriu e olhou para os dois com profundo agradecimento.
– Preciso fazer alguma coisa por vocês. As pessoas irão fazer perguntas, querendo saber quem são vocês. Precisamos contar uma estória, pois não posso sair por ai dizendo – “Olha! Eles são anjos!” – Caso as pessoas acreditassem seria uma verdadeira loucura. Vocês não entendem o grau de devoção que as pessoas têm por aqui!
Luiza se referia a cidade de Juazeiro, com cerca de duzentos e cinquenta mil habitantes, um dos maiores centros de religiosidade do Brasil, devido à figura do Padre Cícero (Padre Cícero Romão Batista)[6], atraindo milhares de romeiros o ano inteiro. Juazeiro se localiza na região metropolitana do Cariri, no sul do estado do Ceará, a pouco mais de quinhentos quilômetros da capital Fortaleza.
– Quem sabe possa dizer que vocês são meus primos e vieram me dar apoio após a morte de João Carlos. Afinal fiquei sozinha com o Carlinhos. Seu Joaquim e sua família foram de uma ajuda ímpar. Estiveram comigo até o enterro. E todo dia alguém aparece por aqui para ver se preciso de algo. Dessa forma primos... Não teremos nenhuma surpresa. – Ponderou Luiza.
– Muito bem! É de fato uma boa solução. E realmente pode contar conosco nas tarefas. Você terá apenas que nos dar orientações. Nunca trabalhamos num local como esse. No Infinito Eterno somos anjos que executam tarefas pré-determinadas, ou ainda, somos capazes de “combater o bom combate”[7]. – Luiza sorri e segue para o quarto com Carlinhos.

VI
Quatro meses depois, totalmente ambientados, Hdhel e Maadel estavam colhendo goiabas do pomar. Já eram três horas da tarde. Luiza se aproximou com uma jarra de suco para oferecer aos trabalhadores incansáveis. Quando chegaram ao sítio, os dois não tinham um fio de cabelo no corpo. Entretanto, já se observava cabelos nos dois intrépidos e suados outrora anjos. Maadel com os cabelos pretos e lisos, com um metro e setenta e cinco de altura, olhos de uma tonalidade castanho-claros, pele bronzeada e os músculos estavam bem desenvolvidos. Hdhel de cabelos castanhos claros cacheados e olhos esverdeados tinha a pele muito branca. Ambos estavam inclusive com barba.
 – Meninos! Trouxe um refresco para vocês. – Aproximou-se Luiza admirada com o empenho daqueles dois homens, se é que se pode chama-los de homens. Ao mesmo tempo, encantada, especialmente com Hdhel, um sentimento forte surgia em sem peito, mas não se permitia externa-lo, pois se sentia culpada, afinal a pouco mais de quatro meses João Carlos, seu marido, faleceu vítima de um infarto do coração, tendo antes então escapado de um acidente na estrada.
– Luiza, muito obrigado, essa goiabas são fabulosas, o cheiro e o sabor são maravilhosos. Faremos ótimas geleias com elas. Amanhã teremos colhido todas as frutas maduras. – Comentou Hdhel. Maadel sorriu e balançou a cabeça positivamente, já pegando um copo com refresco.
Saborearam o refresco em meio a uma animada conversa. Inesperadamente Hdhel e Maadel calaram-se e ficaram com expressão séria olhando para o alto.
– O que aconteceu meninos? Assustada perguntou Luiza. – vocês finalmente estão ouvindo a “voz”? – Não recebeu nenhuma resposta. Passaram-se cinco minutos e eles despertaram daquele aparente transe. – E então? Ouviram a “voz”?
            – Luiza! Afaste-se rapidamente! – Gritou energicamente Maadel. E Luiza deu dez passos para trás.
            Aquela tensão ia aumentando. Naquele momento não se ouvia nenhum som na natureza. Parecia até que nem mesmo as formiga ousavam se mexer. E os pés de goiabas nem se agitavam com o vento. Os dois companheiros se deram as costas e ficaram cada vez mais em alerta. Um som ensurdecedor como um forte trovão ribombou.
            – Maadel, como iremos proceder? Caso venham em um ataque em massa como vamos nos defender? E essa família maravilhosa que nos acolheu? – Então, sem saber de onde, quatro seres surgem em volta deles. Pareciam grifos. Corpo de leão, cabeça de pássaro e grandes asas. Suas garras ostentavam unhas afiadas e duas presas gigantescas saltavam da boca curvando-se para trás como navalhas. No corpo, no lugar de pelos, surgiam escamas prateadas como se fosse uma armadura, um exoesqueleto na verdade.
            – Divino Senhor! – Dai-nos força para vencer essa provação. – Suplicou Hdhel. Os seres não expressaram nenhum som. Apenas os fitavam com olhos ameaçadores. E seguida, um figura humanoide surge na frente das criaturas.
            – Olá companheiros!
            – Bessiel!? – Gritou Hdhel. – O que você quer sua raposa traiçoeira? Nunca fomos companheiros!
            – Calma lá! Venho negociar. Queremos vossa cooperação. Caso nos ajude os levaremos de volta ao Infinito Superior com vossos status de volta – Bessiel era um dos anjos que tramavam a queda dos arcanjos e dessa forma, assumiria a liderança de uma das hostes.
            – Vocês são traidores sujos e o lugar de vocês já está reservado. Aguardem a mão pesada do destino! – Maadel respirando apressado falou.
            – Vamos lá rapazes, coopereis, vós não têm saída. – Bessiel falava enquanto avançava na direção dos intrépidos heróis.
            – Fique por ai mesmo. Não confio em uma palavra sua. – Hdhel, falando por entre os dentes, expressa um fúria insana. Enquanto isso, Luiza distante uns vinte metros. Ouvira um forte trovão. Mas não entendia o que se passava. Hdhel e Maadel começaram a falar com alguém, mas Luiza nada via.
            – Pensem bem. Vós estais aqui nesse lugar sem suas asas, sem armas e sem poderes. E eu tenho a minha disposição quatro trunfos. O que vós dizeis? – Bessiel com ar de quem já venceu a batalha retruca.
            – Prefiro morrer aqui. Lutando do que me arrastar aos pés de ratos como você! – Respondeu Hdhel inflamado.
            – Fizestes tua escolha. Agora não tereis mais volta. Sofreis! Pois as consequências de vossos atos os destruirão. – Bessiel recuou para trás das criaturas, que rosnaram enquanto escorria uma baba espessa da boca e os olhos faiscavam de ódio. Eram feras que quando soltas quase nada poderia parar, somente anjos com armas de luz.
            – Prepare-se meu amigo. Chegou o momento que tanto temíamos. Podemos até perecer aqui, pois agora temos uma vida como todo mortal. Todavia, não irei esmorecer até a última gota de meu sangue. – Em postura de defesa, os dois destemidos, sem que nada fizessem, sentiram um calor interior, e um brilho surgiu em sua volta. – Você sentiu Maadel? Alguma coisa está acontecendo. – As criaturas saltaram em direção deles, mas ficaram paralisadas no ar. Em cada mão de Maadel surge uma pequena espada de forma curvada, com cerca de vinte centímetros. O cabo das espadas era uma manopla e a lâmina ficava para baixo, com o fio da espada para frente e projetando-se para o antebraço uma proteção de metal. Já Hdhel, tinha em suas mãos uma arma comprida como uma lança, feita de um metal reluzente. Em uma das pontas uma lâmina circular, como uma cimitarra de vinte centímetros e na outra extremidade uma ponta de lança negra, comprida e afiada. Os dois se olham e sorriem. Então o tempo volta a correr. As criaturas se precipitam contra eles.
            Maadel, com habilidade de quem participou de diversas contendas, desliza para frente e por baixo escapando do ataque. Hdhel salta e coloca na boca da criatura sua lança de duas pontas pela parte lateral da arma. Rodopia apoiado na arma e fica deitado sobre o dorso do animal olhando para cima, e com um forte movimento, a arma que estava na boca da criatura é puxada para seu peito, deslocando o pescoço da fera e um forte estalido é ouvido. Salta e observa a criatura cair. Bessiel fora do combate observa tudo atônito e não acreditando nos seus olhos. Luiza continuava vendo apenas Maadel e Hdhel realizando movimentos impossíveis e não enxergava as criatura nem Bessiel.
            Maadel fica de pé em tempo de ver a manobra realizada por Hdhel, e a queda da fera. A que saltou em sua direção volta para cima dele, agora acompanhada de uma segunda. – Venham criaturas vis! Nada temerei! – Elas se precipitam sobre dele. Maadel joga agora o corpo para o lado, em seguida crava suas espadas circulares no dorso do animal, que estremece e cai, gira o corpo urrando de dor e em seguida para sem vida. A segunda investe novamente. E com o antebraço direito protegido pela arma que usava, recebe uma mordida da fera, que atinge apenas o metal da arma. De frente então para o perigo, usa a mão esquerda, desferindo um golpe de cima para baixo com a espada no crânio da fera. Com uma única estocada a lâmina penetra fundo. Tirando o braço da boca desfere um soco com a manopla e a fera cai estremecendo em seus pés.
            A última das feras estava para atacar Hdhel. Salta e esse se agacha e usa a ponta de lança por baixo, atingindo o que seria o coração. A lança penetra fundo até atravessar o corpo do animal. Tudo foi tão rápido. E da mesma forma que apareceram as criaturas desaparecem e as armas também. Bessiel sem acreditar no que presenciara, pisca atônito e some em seguida num brilho. Os dois amigos se aproximam e se abraçam sorrindo, ainda com a adrenalina acelerando seus corações.
            – Você viu Maadel! Ele ainda olha por nós. Não tem outra explicação.
            – Sim meu amigo! Precisamos orar – Maadel entusiasmado comemora. Luiza nos últimos meses, pelo menos duas vezes por dia, ajoelhava-se no seu altar, junto com os dois amigos e orava a Deus. Impossibilitados de ouvir a “voz”, receberam essa graça pela fé que demonstraram. Luiza vendo os dois se abraçando e rindo se aproxima.
            – O que aconteceu aqui? Via vocês dois saltando e gritando. Agitando-se no ar e realizando movimentos atléticos como numa luta. Mas não via nada.
            – Você não os enxergava? Talvez tenha sido melhor assim. Fomos atacados e nos defendemos. Nossas armas pessoais surgiram em nossas mãos na hora da contenda. Foi Deus que olhou por nós. Graças às orações que aprendemos a fazer com você. – Os três se abraçaram felizes.
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            – Bessiel! Como tu levas quatro caçadores implacáveis, para coagir dois anjos sem asas, caídos naquele lugar de fracos e retornas de mãos abanando e sem os caçadores?
            – Tu não vais acreditar! Eles estavam ajudando uma humana nas tarefas, perfeitamente integrados como qualquer outro daqueles. Eu surgi diante deles e fui menosprezado. E para coagi-los joguei os quatro caçadores sobre eles. Mas do nada, eles conseguiram materializar armas de luz, espadas e lança. E em poucos minutos colocaram por terra quatro caçadores com histórico de cem por cento de aproveitamento em todas as missões. Eles deveriam permanecer completamente impossibilitados de reagir, mas se comportaram como guerreiro de mil vitorias.
            – O que tu estais me contando? Primeiro eles são arrebatados do fosso sem fim e agora isso! Como pode ser? Eles realmente estão recebendo ajuda superior. Precisamos localizar de qual esfera. Enviaremos imediatamente os mensageiros-espiões por toda parte, para os recônditos mais improváveis do Infinito Superior. Precisamos encontrar alguma pista que nos leve ao apoiador daqueles dois.
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Passaram-se três dias depois do ataque, Hdhel e Maadel seguem juntos com Luiza para visitar a estátua de Padre Cícero. Estavam bem vestidos, de barba feita com os cabelos cortados.
– É um maravilhoso monumento. Uma verdadeira ode a fé desse povo que sofre no sertão! O nordestino esse forte! Tão sofredor na época das secas e na chuva que em excesso destrói tudo. – Comenta Luiza. – A estátua com vinte e sete metros de altura, fica aqui na Colina do Horto. Conta à história que no ano de 1889, durante uma missa celebrada pelo Padre Cícero, a hóstia ministrada pelo sacerdote à beata Maria de Araújo se transformou em sangue em sua boca. Conforme relatos da época o fenômeno se repetiu por cerca de dois anos. Entretanto, posteriormente, a igreja disse que tudo não passava de uma farsa, levando à excomunhão do Padre Cícero, que nunca foi realmente aplicada[8]. Atualmente, o Padre Cícero foi canonizado pela Igreja Católica Apostólica Brasileira. E muitos milagres e graças são atribuídos a ele. Padre Cícero faleceu com noventa anos em vinte de julho de mil novecentos e trinta e quatro e sepultado na Igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro também em Juazeiro.
Após a visita a estatua, foram procurar algum lugar para comer e onde Luiza pudesse aquecer água para preparar o mingau de Carlinhos. Deliciaram-se com uma carne de sol e baião de dois.

VII
            Nos quatro meses em que nossos dois anjos caídos estiveram na casa de Maria Luiza, hospedados como primos que vieram em seu auxilio naquela hora tão triste, muita coisa aconteceu. Seu Joaquim e seus filhos ocasionalmente visitavam o sítio, prestando auxílio sempre que necessário. Mas sempre estranhavam aqueles dois homens, que apesar de serem sempre solícitos e amáveis, transpareciam uma aura de mistério.
            Eram meados de abril, os dois sempre estavam junto de Luiza. Aprenderam a orar e sempre nos domingos a acompanhavam à missa. E após a celebração os dois ficavam de joelhos a orar por quase meia hora. Um dia Luiza foi mais cedo para aproveitar e confessar-se com o padre José Luís. Maadel curioso perguntou se poderiam se confessar também. – Como se confessar? Vocês precisam disso? – E ele respondeu – Afinal não estamos aqui na Terra com você! E agora somos humanos, servidores do Senhor, e devemos ter as mesmas obrigações. Foi então ter com o padre a confissão.
            – Olá meu filho. Benze-se e ore comigo o ato de contrição. – Disse o padre.
            E oraram juntos: – “Meu Deus, porque sois infinitamente bom e Vos amo de todo o meu coração, pesa-me Vos ter ofendido, e, com o auxílio da Vossa divina graça, proponho firmemente emendar-me e nunca mais Vos tornar a ofender; peço e espero o perdão das minhas culpas pela Vossa infinita misericórdia. Amem.”
            – Você tem alguma coisa para falar meu filho? – Perguntou o padre.
            – Padre! Não sei por que estou aqui! Eu e meu amigo temos uma missão e temos orado todos os dias a Nosso Senhor Nosso Deus para nos orientar, mas não temos obtido nenhuma resposta. – Comentou Maadel.
            – “Pedis, e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes em vossos deleites.”[9] Deves orar com afinco filho. Deus nosso Pai sempre nos escuta, mas Ele precisa enxergar o amor nos nossos corações! E devemos saber que: “Tudo tem a sua ocasião própria, e há tempo para todo propósito debaixo do céu. Ha tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou; tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derribar, e tempo de edificar; tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar; tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de abster-se de abraçar; tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de deitar fora; tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar; tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e tempo de paz.”[10] Assim filho, abra seu coração sempre que orar e espere em Deus. “Pois mil anos, aos teus olhos, são como o dia de ontem que se foi e como a vigília da noite.”[11] “Para o Senhor um dia é como mil anos, e mil anos como um dia.”[12] Se orar com fé tudo é possível! Jesus disse: “se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e ele passará. Nada vos será impossível.”[13] Acalma teu coração filho e segue em paz! Reze um Pai Nosso e uma Salve Rainha!
            Maadel chegou para Luiza exultante. – Luiza! Estou tão feliz! Agora acredito que nosso Senhor pode ouvir-nos. O padre disse belas palavras e acalmou meu coração. Venha aqui Hdhel! Quero conversar contigo e contar o que ouvi. – E assim foi. Os dois nesse dia riram muito, pois acreditavam que tudo era possível.
            Após a missa foram tomar um sorvete. Era a primeira vez que eles iriam provar dessa delicia. – Que coisa gelada! – Com alegria Hdhel comentou. – Caso um dia voltemos para o Infinito Superior vou sentir saudades de tudo isso. Especialmente de você e do Carlinhos. – Luiza então corou. Mas não entendia aquilo. Afinal, amara seu marido e ele partiu há tão pouco tempo, como poderia sentir algo por aquele homem, que nem homem na concepção da palavra era. Ele e seu amigo eram anjos. Então ela se lembrou de um trecho de uma canção que ela gostava: “E um anjo do céu que me escolheu, serei o seu corpo guardião da pureza... Que é pra eu cuidar. Que é pra eu amar. Gota cristalina. Tem toda inocência...”[14]
            – Senhor meu Deus – Pensou Luiza. – Apascenta meu coração! Dê-me forças para cumprir o que quer que tenha traçado para mim! Eu espero em Ti!
            Caminharam então na direção do carro e encontraram Seu Joaquim caminhando para exercitar-se.
            – Boa noite Seu Joaquim!
            – Oh! Olá Luiza! Boa noite! E boa noite para vocês também rapazes! Foram à missa então? – Seu Joaquim estava de calça moletom, uma camiseta branca e tênis, bem diferente de como se veste no dia a dia.
            – Boa noite senhor! – Exclamaram em coro Hdhel e Maadel.
            – Estou cuidando da minha saúde. Meu cardiologista recomendou fazer caminhadas, mas só tenho tempo à noitinha. Todos devemos cuidar dessa máquina. Desculpe comentar, mas foi justamente depois do ocorrido com o Carlos que fui consultar o médico e passei a me cuidar melhor. – Comentou Seu Joaquim, baixando a cabeça.
            – Não precisa lamentar Seu Joaquim! Sinto falta de meu marido e vou sentir por toda vida. Mas tenho o Carlinhos para criar. A vida segue em frente. E fico feliz que agora o senhor está se cuidando.
            – Pois então! Deixem-me ir. Tenham uma ótima noite e uma boa semana. – Seu Joaquim curva a cabeça em reverência e vira o corpo para atravessar a rua. Todavia, não atentou para o tráfego, afinal já era noite e domingo, tudo era mais tranquilo. Quando deu por si um caminhão vinha na sua direção. Foi Hdhel que viu e gritou inutilmente. Alguma coisa nele agiu de forma abrupta. Saltou como um felino na presa empurrando Seu Joaquim e rolando junto. O caminhão passou e freou mais na frente.
            – Meu Deus do Céu! Quase que atropelo você “homi”! Se não fosse Deus para alertar esse rapaz o senhor tinha virado pudim.
            Hdhel se levantou e ajudou Seu Joaquim que estava um pouco arranhado. Sacudiu a poeira da roupa de Seu Joaquim.
            – O senhor está bem? Vi o caminhão e não tinham outra coisa que pudesse fazer. Gritei mas o senhor não ouviu. Então minha alternativa foi pular e rolar com o senhor. – Ainda com a adrenalina a mil, comentou Hdhel.
            Seu Joaquim observava Hdhel com cara de bobo e o abraçou chorando. – Rapaz! Você foi meu anjo da guarda hoje! Muito obrigado! Que Deus o proteja também! – A partir daquele dia Seu Joaquim passou a ver aqueles dois com outros olhos. Alguns dias depois até apareceu no sítio levando mel em favo para Hdhel. – Aqui meu jovem, para adoçar sua vida!

VIII
            Estava iniciando o mês de agosto, Hdhel e Maadel estavam sentados abaixo de um frondoso pé de ipê. Conversavam sobre tudo que acontecera até ali.
            – Maadel, amigo! Temos ajudado Luiza todos esses meses para compensar a estadia que ela tem nos proporcionado e o apoio incondicional que ela nos dá. Mas precisamos tomar uma atitude. Já se passaram quase cinco meses que chegamos aqui. Já lutamos contra caçadores e incrivelmente armas de luz se materializaram para nós. Temos orado incessantemente, uma vez que não ouvimos a “voz”. E por tudo que aconteceu acredito piamente que nosso Deus olha por nós. Mas por que Ele nos deixa aqui? O que será que Ele quer que nós realizemos ou venhamos a aprender.
            – De fato caríssimo Hdhel! Por meus pensamentos tem passado muitas coisas. Eu sou um anjo da guarda. Busco coisas e pessoas. De acordo com a missão que sou designado. Você sabe inclusive que Luiza fez parte de uma dessas missões. Somente Deus sabe o que está reservado para ela. Mas e você? Fomos convocados juntos para uma missão de reconhecimento dentro do Infinito Superior. E o que nos aconteceu?
            – O que tem a minha pessoa Maadel? – Curioso pergunta Hdhel.
            – Ora amigo! Nós dois sabemos a sua natureza. Quando nos agarraram e jogaram no fosso sem fim você nem sequer reagiu. E Aqui quando fomos atacados você foi suave com os caçadores. Por que isso?
            – Apesar da minha natureza caro Maadel, não posso sair destruindo e matando a todos. Isso acontece apenas quando sou ordenado por forças superiores.
            – É eu sei. Imagine se aqueles que nos atacaram e nos jogaram no fosso conhecessem sua natureza? Não teriam nem ousado nos fazer mal. Afinal!? Você tem uma missão? Você sabe por que estamos aqui?
            – Sei tanto quanto você amigo. Minha condição simplesmente me impede de agir com pura força. Não sei se estou me contendo ou se simplesmente algo está me contendo. Apenas sei que devemos permanecer em alerta, a qualquer momento podemos ter que lutar novamente.
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            Enquanto isso, no Infinito Superior. Dois seres revestidos de luz dialogam.
            – Macalel! Precisamos estar em alerta. Nossos espiões enviados por todo o Infinito Superior não conseguiram descobrir absolutamente nada sobre aqueles dois. Por mais que interrogassem e buscassem informação em várias esferas, não obtiveram um sinal ou uma emissão de energia irregular que pudesse denunciar o que tem acontecido na Terra.
            – Meu caro Jahel, tu já levastes em consideração que Ele possa interferir nas ações daqueles anjos? Sabemos com certeza quem eles são? De onde vieram e como se infiltraram em nosso meio? Nossas ações estão sendo construídas desde o passado até o futuro, com influências diretas no que realizamos aqui e agora. Em breve teremos força suficiente para derrubarmos os arcanjos que comandam as hostes e legiões, e então colocaremos nossos comandados no poder. Tudo arquitetado e pensado na periferia do Infinito Superior, onde Ele não tem acesso, a não ser por intermédio de anjos enviados. Assim, quando menos esperar, teremos todo o controle e poderemos ter nossa própria voz.
            – Sabemos que eles eram anjos como nós. Que executavam missões de busca e de guarda. E que foram designados como apoio para essa região da periferia. E como estavam interessados por demais em assuntos que não lhes cabia, metendo o nariz e investigando fatos alheios a missão primordial e chegando próximo a solucionar ações que deveriam permanecer incógnitas até o momento final. Os capturamos, suprimimos suas asas e jogamos no fosso sem fim, de onde não deveriam ter possibilidade alguma de sair. Mas pasmem de alguma forma foram arrebatados da queda e jogados na Terra, o mais estranho ainda, foram capazes de rebater o ataque de caçadores, feras que quando postas em ação nada pode pará-las, ou pelo menos quase nada. E então, aqueles dois anjos aparentemente sem nenhuma força e apoio, recebem armas de luz e as utilizam como verdadeiros mestre, quando não deveriam passar de simples anjos de busca e guarda. Isso também me leva a pensar mais seriamente. E o fato de nada encontrarmos pode ser um indicativo que nossas ações na periferia podem ter vazado. E Ele já saber tudo que é preciso. Felizmente não tivemos a presença de nenhum outro anjo. Mas o que me deixa mais intrigado é o fato de não terem sequer perguntado por Maadel e Hdhel. – Conjecturou Jahel.
            Macalel fica pensativo e comenta. – Sim, isso é suspeito. Energias desse porte somente são manipuladas das esferas superiores, através de canais fluidos, que podem ser detectado e rastreados, mas nem um traço de canal foi encontrado. A energia foi criada já perto deles e manipulada para gerar as armas de luz. Canais curtos dessa natureza eu nunca vi. Somente uma fonte de poder muito grande pode realizar tal feito. Portanto, minha opinião é que devemos agir imediatamente e colocar nossos planos em ação em vários pontos simultâneos. Fico pensando se devemos ou não dar cabo daqueles dois ou simplesmente esquecê-los.
            – Não podemos ficar parados. Já mobilizei uma unidade que é insuperável. Irão realizar infiltração, ataque e domínio. E aqueles dois não terão como reagir. Serão capturados ou eliminados caso resistam. As ações já estão em andamento. Teremos uma resposta em breve. – Sorrir Jahel, recebendo um aceno positivo de Macalel.
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            – E então Radhiel? Já colocastes aqueles dois que tu contrataste para vigiar “nossos garotos”? – Perguntou o mais alto e forte, que era um ser abjeto. Os foram destinados para capturar ou dar cabo de Hdhel e Maadel – Tu sabes que não podemos falhar.
            – Eles já estão a postos, levantando todos os dados que precisamos. São de uma agência de detetives que contratei em Fortaleza. Eles pediram uma semana para entregar o relatório. Tive que criar uma estória mirabolante para que eles não ficassem fazendo perguntas, mas não sei se acreditaram. – Respondeu Radhiel para o outro anjo.
            – Muito bem! Podemos aguardar então. É o tempo para recebermos reforços que irão nos auxiliar na ação. Então atacaremos sem piedade. Eles não irão nem saber o que aconteceu. Eu sei que nessa hora você não estará presente. Não vai querer sujar suas mãozinhas!
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            – Maadel! Você sentiu?
            – Sim irmão! O vento mudou de direção e posso sentir o cheiro no ar. Como será possível Eu nunca tive esse tipo de habilidade. – Respondeu Maadel admirado de seus novos poderes encarando Hdhel.
            – Ahahahah! É a convivência comigo irmão. Você tem a habilidade de simular ou mimetizar as minhas capacidades. Poucos são os irmãos capazes desse feito. É preciso muito amor ao próximo para realizar. Mas é isso. Algo está para acontecer. Alguns seres estão aqui e não temos como saber o que pretendem até o último minuto.

IX
            Era setembro, quase primavera. O ar exalava um cheiro diferente que chamava para confraternizar a união, e isso deixava tudo mais difícil. Luiza despertou muito apreensiva. Na verdade nem conseguiu pegar no sono. Carlinhos tinha chorado muito durante a madrugada, e Luiza não conseguiu saber o que ele sentia. Foi à cozinha para preparar o café da manhã e mais uma vez encontrou a mesa posta. Café feito, o pão caseiro devidamente assado, leite fresquinho. Hdhel era o responsável. Ele fez questão de aprender a cozinhar, pois para ele comida era o que de melhor existia na Terra e dizia que os homens eram privilegiados por ter tanta beleza e fartura. E lamentava saber que tantos não tinham a mesa tais sabores. Entretanto, Luiza não estava com disposição para comer, não naquela manhã. Tomou apenas um café e foi para o quarto. Maadel e Hdhel já estavam a mais de meia hora trabalhando no pomar, preparando a terra com adubo orgânico para a próxima safra de frutas.
            Carlinhos ainda chorava muito. Luiza o pegou e o colocou na cadeirinha no carro. Foi dirigindo até o pomar e avisou aos nossos dois intrépidos heróis que iria ao médico pediatra do Carlinhos. Hdhel se ofereceu para ir junto, mas Luiza disse que não havia necessidade, que poderiam continuar com seu trabalho. Partiu por volta das oito horas da manhã...
Quinze horas e vinte minutos... Hdhel chega para Maadel e comenta: – Irmão! Será normal toda essa demora? Já faz muito tempo que Luiza saiu para o médico com o Carlinhos.
            – De fato! Não queria tocar no assunto, vamos até em casa e ligar para o celular de Luiza. – Os dois seguem para casa, lavam-se e ligam para Luiza. O telefone toca e ninguém atende. Tentam um, duas, três vezes e ficam desorientados. Não estavam preparados para aquela situação. – Já sei! Ligue para o Seu Joaquim, quem sabe ele pode nos ajudar.
            – Boa ideia Maadel. – Hdhel liga para Seu Joaquim e explica o que estava acontecendo e Seu Joaquim fala que alguma coisa grave estava acontecendo com o Carlinhos para ela não ter retornado para casa, nem atender ao telefone. Combina que passaria daqui à uma hora e caso Luiza não tivesse retornado iriam até a cidade para buscar respostas.
            – Estou preocupado Maadel! Aquela sensação de dias antes voltou e essa demora da Luiza não parece um bom sinal. Tem algo estranho no ar e não apenas o mal estar do Carlinhos. Algo está acontecendo.
            Dali a alguns minutos Seu Joaquim chegou e perguntou se Luiza havia retornado. Então os três partiram rumo ao centro da cidade. Foram à clínica cujo endereço Luiza havia deixado na mesa do telefone.
            – Boa tarde senhorita! – Disse Seu Joaquim para a atendente da clínica.
            – Bom tarde senhor em que posso ajudar?
            – Por favor, caríssima. Minha amiga Luiza veio com seu filhinho, o Carlinhos para uma consulta médica logo pela manhã cedo e já são dezessete horas e ela não retornou para casa. Você poderia me dizer se o Carlinhos foi internado?
            – O senhor não é da família?
            – Sou um grande amigo e vizinho dela. Mas esse dois são primos e moram com ela. Ela é viúva.
            – Sei! – Disse a atendente olhando séria para os três. – Deixe-me ver. Eu sei quem é dona Luiza. Aqui está Antônio Carlos de Oliveira. Ele foi atendido logo cedo pelo doutor Mario. Na ficha diz que ele estava com dores de ouvido, foi medicado e liberado. Portanto, ele não foi internado.
            Os três saíram da clínica muito apreensivos e combinaram de procurar informações por perto. O dia estava terminando e precisavam agir rápido. Meia hora depois se encontraram e não constataram nada. Súbito, um morador de rua os interpelou.
            – Ei! Vocês estão procurando a dona Luiza?
            – Sim, você a conhece? – Perguntou Seu Joaquim.
            – Ela é uma mulher muito boa. Sempre que vem aqui no centro me traz algumas frutas maduras. Hoje ela chegou e nem falou comigo. Entrou direto na clínica com o menininho. Algum tempo depois quando saía, um carro grande parou e dois homens a colocaram dentro e partiram. Tentei ver a placa, mas não tinha nenhuma. Procurei os soldados que andam na praça e eles me botaram pra correr. Para procurar o que fazer.
            – Isso é muito sério! Vamos até a delegacia para iniciar uma busca. Você vem conosco.
            Na delegacia explicaram o ocorrido e o que presenciou Manezim, o rapaz morador de rua e de como foi tratado pelos soldados. O delegado disse que lamentava o ocorrido, e que iria investigar a negligência dos soldados. Porém, quanto ao desaparecimento teriam que aguardar vinte e quatro horas.
            – Como vinte quatro horas. Ela foi sequestrada. Sabe lá Deus por quem! Vocês precisam agir. – Muito nervoso Seu Joaquim partiu para cima do delegado.
            – Calma Seu Joaquim! Sei que o senhor está nervoso, mas o melhor é ir para casa. Caso tenha sido sequestro eles podem entrar em contato para pedir resgate. Rezar a Deus para esperar o melhor. Torcer para que peçam resgate e que ela possa retornar sã e salva com o filhinho. Vou designar uma viatura para ir até o sítio com vocês. De repente até já ligaram e não encontraram ninguém.
            – Tudo bem! Talvez o delegado tenha razão. – Disse Hdhel. – Vamos Seu Joaquim. Precisamos retornar para o sítio.
            Saíram e retornaram para a casa do sítio. Seu Joaquim estava muito nervoso. Parecia que uma filha tinha desaparecido. Hdhel e Maadel no íntimo pareciam desconfiados de algo. Mas não poderiam comentar. Entraram e sentaram no sofá. Seu Joaquim liga para sua casa e informa o que estava acontecendo. Senta-se e súbito o telefone toca.
            – Pois não! – Disse Hdhel.
            – Olá Hdhel! Exclamou uma voz no telefone.
            – Quem é? Como sabe quem está falando?
            – Calma anjinho! Como não saberia quem está falando? Eu pensava que tu serias mais perceptivo. Esqueceu quem arrancou tuas asinhas. Ahahaha!
            – Miserável! O que você fez com Luiza? Se mexer num fio de cabelo dela você vai se ver comigo. Fala logo o que quer!
            – Calma, calma! Vós não sois páreos para mim. Já vos esquecestes de antes foi? Nós vos queremos. Depois ela está livre.
            – E o Carlinhos? Ele estava doente.
            – Não somos tão cruéis. O garotinho foi medicado e já está melhor. Ficaram bem se fizeres tudo que ordenarmos.
            – O que querem que façamos?
            – Estamos num galpão na periferia da cidade. Pela manhã ligo novamente e digo como fazes para chegares aqui, e não te esqueças de trazer teu amiguinho. Boa noite anjinho. – Desligou em seguida sem dizer mais nada.
            – Eram os sequestradores? – Perguntou seu Joaquim. – O que querem de resgate?
            – É muito delicado Seu Joaquim. – Respondeu Hdhel. – Eles querem a mim e Maadel.
            – Como assim? Você conhece os sequestradores?
            – Mais ou menos! Sente-se Seu Joaquim! Vamos contar para o senhor o que aconteceu. Peço que escute com parcimônia. No final faremos tudo para que os dois retornem sãos e salvos. – Hdhel iniciou e vez ou outra Maadel intervinha para acalmar Seu Joaquim. Contaram como tudo se sucedeu com suas ações e o primeiro ataque. Seu Joaquim olhava atônito e sem acreditar no relato daqueles dois.
            – Calma lá! Vocês querem que eu acredite que são dois anjinhos e que tudo ficará bem. Não me venham com lorotas.
            – É sério Seu Joaquim! Não estamos dizendo que tudo ficará bem, mas faremos o possível para que Luiza e Carlinhos voltem em paz para casa. Apegamo-nos muito a eles. Esse que nos ligou não é exatamente um anjo, pelo menos não é mais. Ele e seus asseclas pretendem de alguma forma obter regalias daqueles que querem dominar uma região do Infinito Superior.
            – Você quer dizer que eles querem se rebelar contra o céu.
            – Algo assim. – Hdhel levanta e chama Maadel. ­– Levante a camisa irmão. – Viraram-se, levantaram a camisa e mostraram a cicatriz. Exatamente igual nos dois. – Veja Seu Joaquim! São as marcas das nossas asas que foram arrancadas. Foi esse que nos ligou que fez isso.
            – Oh minha nossa! O que é que isso?! Vocês querem dizer que aqui tinha um par de assas nas costas de vocês? – Seu Joaquim toca nas cicatrizes de Hdhel e Maadel. Não pode ser! Vocês de fato são anjos? – Seu Joaquim se ajoelha em frente deles.
            – Que é isso Seu Joaquim! Não somos santos! Somos anjos que caíram! Somos seus amigos e queremos que Luiza saia ilesa dessa contenda. Pela manhã eles ligarão e saberemos para onde ir. Até lá precisamos orar e traçar uma estratégia. O senhor precisa retornar para sua casa. Descanse e, por favor, não comente com ninguém o que lhe contamos. Pode ser perigoso.
            – Agora entendo vocês! Todo o cuidado e atenção que mantinham por Luiza e Carlinhos. Esse amor incondicional que apresentavam. Somente sendo seres divinos. Deus de bondade obrigado por essa dádiva! Depois de tudo isso eu não vou conseguir pregar o olho. Vou para casa sim. Tentar tranquilizar todos por lá. Muito cedinho retorno, e não façam nenhuma ação sem minha presença. Tenham uma boa noite. – Seu Joaquim abraça os dois e sai. Então os dois intrépidos se ajoelham em frente ao altar e rezam por uma hora. Depois se sentam à mesa para traçar uma estratégia de contra-ataque.
            – Irmão! Amanhã pela manhã quando nos encontrarmos com aquele, como poderemos proceder sem por em risco Luiza e Carlinhos? – Muito preocupado pergunta Maadel. – Caso venhamos a usar armas de luz novamente poderemos arriscar suas vidas. Afinal são muito frágeis. Isso é, caso as armas de luz se materializem.
            – Maadel! Maadel! Talvez tenha chegado nossa hora. Provavelmente será melhor nos entregarmos e propor a libertação dos dois. Antes nós do que eles. Assim retornaremos para o Infinito Superior. Quem sabe lá recebamos ajuda!?
            – Nos entregar! Depois de todo esforço que realizamos? Será realmente o melhor a fazer? E você? Não vai partir com tudo? – Excitado comenta Maadel.
            – É muito arriscado irmão! Gosto demais daqueles dois. Não quero ter essa culpa em meus pensamentos. Quando nos informarem o caminho e a localização desse galpão, nós iremos até lá, até prefiro ir sem o Seu Joaquim, seria mais um em perigo. E pedimos que eles libertem Luiza e Carlinhos. Quando estiverem a salvo partiremos com eles. – Planeja então Hdhel.
            – Muito bem Hdhel, você sempre foi o estrategista. Confio no seu discernimento. Só espero que eles também queiram assim. Agora vamos descansar um pouco. Precisamos dormir para repor nossas forças, seja qual for à ação empregada!
             
X
            Era o dia vinte de setembro. Primavera. Pelas cinco horas da manhã Seu Joaquim chega. Hdhel e Maadel estavam preparando o desjejum. Seu Joaquim sentou a mesa e ficou observando aqueles dois que se diziam anjos. Comportavam-se como qualquer pessoa normal. Iam de um lado a outro realizando tarefas. Hdhel saiu e retornou com um balde de leite. Enquanto Maadel preparava tapioca e colocava queijo coalho de recheio. Seu Joaquim passara a noite quase em claro se questionando sobre o que eles contaram na noite anterior. Rezou bastante e tinha formulado diversas perguntas para fazer a eles. Tudo pronto. Sentaram para tomar café e deliciarem-se com aquelas tapiocas.
            – Seu Joaquim! Sabemos que o senhor quer ajudar. Nós conversamos e oramos muito esta noite. Traçamos nossa estratégia de ação. E concordamos que será melhor que o senhor não se envolva nessa ação. Será muito perigoso e não queremos coloca-lo em risco também, aqueles seres são muito imprevisíveis. – Explanou seu ponto de vista Hdhel tendo a concordância de Maadel.
            – Nem pensem nisso meus caros. Também orei muito, eu e Marieta minha mulher. Pedi a Deus discernimento sobre o que me disseram e luz para fazer a coisa certa. Tive em sonho a resposta. Um ser luminoso me apareceu. Tocou minha cabeça e disse: “Joaquim! Nada temas! Tu estás amparado por seres gloriosos! Eles farão a coisa certa na hora certa!” E então acordei. Já eram quatro e meia. Então tratei de levantar, orei novamente, me despedi de Marieta e vim ter com vocês.
            – Seu Joaquim! O senhor não sabe o quanto nos alegrou com essa mensagem! Pois desde que aqui chegamos temos orado sempre e nunca obtivemos resposta. Agora poderemos agir na certeza de Nosso Senhor. Obrigado! – Disse Maadel se levantando junto com Hdhel e abraçando-o.
            Após o café, Maadel deixou Hdhel na sala com Seu Joaquim para atenderem ao telefone quando tocasse e foi lidar com as tarefas mais básicas do sítio, como alimento e água dos animais, limpar as baias. E alimentar as galinhas. Nove horas da manhã o telefone toca e Hdhel atende.
            – E então anjinho? Pronto para partir? – Aquele que sequestrou Luiza debocha ao telefone. – Venham até mim como cordeirinhos e eu liberto a mulher com o garotinho. Nada vai acontecer a eles.
            – É bom mesmo ser ignóbil! Esses dois são puro ouro! Você é nada diante deles! – Hdhel desafiou então aquele. – Trate-os muito bem ou vai se ver comigo!
            – Tolo! Não passam de macaquinhos! E tu não tens capacidade de me enfrentar. Tenho que lembra-lo do que sou capaz? Posso quebra-lo como um graveto!
            – Você é que não sabe de nada! Diga-me logo o endereço e vamos ter contigo.
            – Pois bem! Ao saírem do local que estão em direção a essa cidade, sigam em frente, não entrem à esquerda. Iram se deparar com uma parada de ônibus à direita e na próxima entrada á esquerda entrem. Sigam sempre em frente e verão o prédio que estamos. – Orientou aquele.
            Hdhel contou a Seu Joaquim o que conversaram ao telefone. Seu Joaquim disse que conhecia o local, uma vez havia feito uma grande entrega de madeira para retelharem o prédio. Então Hdhel saiu para chamar Maadel e preparam-se para partir. Dez em meia estavam na estrada. Onze horas viram o galpão. Hdhel fica petrificado por um instante.
 – O que houve caro Hdhel? Está tudo bem? – Pergunta Seu Joaquim.
– Lá dentro! Não tem apenas anjos! Há caçadores. Não sei quantos. E alguns seres abjetos como aquele que nos admoestou. Está muito arriscado Seu Joaquim. Mas sei que não vai adiantar dizer que saia daqui. Você sentiu mais alguma coisa Maadel?
– O mesmo que você! E sei que eles não estão ai para brincadeiras. Serão capazes de qualquer coisa. Devemos ter muito cuidado nas ações. Nunca imaginei que tantos seres abjetos estariam envolvidos nas ações realizadas por aqueles da periferia do Infinito Superior!
– De fato meu irmão! Será uma contenda complexa. Vamos! Não podemos ficar aqui parados! – Hdhel foi descendo do carro e respirando fundo. – Seu Joaquim! Por favor, se possível não fales nada. Caso perguntem o que faz ali, deixe que nós respondamos. Eles não costumam gostar de humanos e reagem muito agressivamente. A propósito! No último ataque Luiza não os via. Pode ser que o senhor não enxergue nada lá dentro ou apenas alguns. Mas saiba que lá está infestado de seres. E os que chamamos de abjetos são os que vocês costumam chamar de demônios. São muito instáveis. Foi um deles que nos arrancou as asas. Nossos irmãos foram muito imprudentes em dar acesso a ele no Infinito Superior, ainda que na periferia onde sorrateiramente construam seus planos sórdidos. Seres abjetos desestabilizam onde tocam. Principalmente no Infinito Superior onde tudo parece ocorre ao mesmo tempo e passado e presente se tocam no instante presente.
Durante alguns instantes ficaram observando o galpão. Seu Joaquim comentou que tudo parecia tranquilo, e estranhou o fato de não ter vigias na parte externa.
– Claro que estão. – Respondeu Hdhel. – Exatamente como falei. Eles estão imperceptíveis a sua visão, mas estão ai. Em cima do galpão tem exatamente oito seres em forma de animais. Aqui embaixo vários abjetos de diferentes tamanhos. Vai ser um páreo duro. Seu Joaquim, nossa prioridade é preservar Luiza e Carlinhos de toda forma. Cogitamos nos entregar para que eles os libertem. Mas temos que contar com a possibilidade deles não quererem liberá-los. E se isso acontecer teremos que lutar por nossas vidas. Percebe como é arriscado! Não são seres humanos que estão lá dentro. São anjos e demônios. Numa união inconcebível. Contrariando a ordem natural do universo. Uma união profana para subjugar uma parte ou o todo Infinito Superior.
– Sim meu anjo guerreiro! Percebo e tenho completa consciência do que está acontecendo. Mas acredito na mensagem que recebi. Vocês dois são seres gloriosos, que lutam pelo amor, verdade e justiça.
– Puxa! Fico até envergonhado com tanta admiração! Espero que possamos responder a altura. – Comenta Maadel. – Afinal nossa missão é apenas servir ao Nosso Senhor. Servir e realizar a vontade Dele. Precisamos fazer o que é certo. E também temos a obrigação de preservar sua vida Seu Joaquim. Seria melhor se ficasse no carro.
– Vim até aqui. Não é. Vou entrar e fazer a minha parte. Não estou despreparado. Trouxe uma arma para ajudar. – Seu Joaquim puxa uma Magnum 45, com pente de dezesseis balas e uma na agulha. – E tenho munição extra.
– Que é que é isso Seu Joaquim!? É Uma arma e tanto! Mas provavelmente não terá uma eficácia muito grande diante dos nossos adversários. Apenas armas de luz podem subjuga-los. Vamos orar para que possamos materializá-las caso necessário. – Hdhel comenta apreensivo. – Caso aconteça uma luta, procure manter distancia da ação.    Temo por sua segurança. Não se envolva numa luta diretamente. OK!?
– OK! Estou ciente do perigo. Vamos entrar. – Resoluto, seu Joaquim se põem a frente do grupo. Hdhel troca olhares com Maadel sorriem e seguem em frente.
XI
Demora um pouco para os olhos de Seu Joaquim se adaptarem ao ambiente. Então perceber ao fundo, sentada numa cadeira estava Luiza e ao lado havia um berço. Atrás dela de pé tinham dois homens, com cara de poucos amigos. Um era alto de cabelos claros e vestia um terno branco, com camisa e gravata branca, e era de uma palidez muito estranha. O outro estava de camiseta preta e jeans, sua brancura da pele também contrastava com o preto da camiseta.
– E então anjinhos? Temos um caso inacabado para resolver. Pediram-me que os levassem inteiros, mas vou adorar arrancar mais alguns pedaços. Que tal? Vocês estão a fim de ser meu prato principal? – Aquele, todo de branco, inicia a conversa.
– Queremos apenas o que for melhor para nossos amigos. Deixe-os ir, vocês podem ficar conosco. Partiremos sem contratempos. – Hdhel pondera tranquilamente.
– Pensa que é simples assim? Estou adorando ter esses macaquinhos comigo. – Aquele se curva para o berço e pega Carlinhos. – Esse pequenino até que é simpático. Sabe que ele não chorou nem uma vez depois que veio para cá. Nós tratamos muito bem dele. Sua mãe estava desesperada por ele, pois estava doentinho. Imaginem que maldade uma criancinha doente. Mas nós compramos o remedinho dele e ele sarou. Não é lindinho. – Então ele aproxima Carlinhos da boca e passa a língua em seu pezinho, era uma língua longa e de duas pontas. – Não é uma delicia!
– Seu inominável doente! Não aproxime essa língua torpe do menino! – Maadel avança com uma ira nos olhos que nunca teve antes. Mas Hdhel o segura firme, pois sabia que não era hora para perder a cabeça. Era exatamente isso que aquele queria. – Sua aparência externa está muito boa, mas sabemos o torpe que há dentro dessa pele de cordeiro. Vil e ignóbil ser. Largue o Carlinhos já estamos aqui, não é?
– Olha só! O anjinho está cheio de si! Esqueceu o que fiz com você antes. Vou adorar arrancar algo a mais. Venha aqui passarinho! Quero sentir que gosto você tem.
– Calma Maadel! Não caia na provocação dele. Precisamos ponderar pela segurança de nossos amigos. E quanto a Luiza seu torpe!? Por que ela está assim? De olhos vidrados sem perceber nossa presença? – Intrigado pergunta Hdhel.
– Ela estava arredia, não queria cooperar. Então um amiguinho meu tomou conta do corpo dela.
– O que você está me dizendo ser abjeto? Um demônio está possuindo o corpo de Luiza? Você não poderia ter feito isso. Vamos ter muita dificuldade para limpá-la! – Agora Hdhel estava ficando nervoso também. Pois ele sabia que uma pessoa possuída, por mais limpa que você a deixa, sempre fica um pouco do mal que a habitou. Afinal de contas todos têm um lado bom e um lado ruim. E esse contato pode fazer o lado ruim amadurecer. É preciso muita oração e fé para purificar-se novamente.
– Pois passarinho! Resta saber se eu não vou querer ficar com ela! Parece que ela é tão saborosa quanto o filhinho! – O ser abjeto fala todas essas palavras com um sorriso de escárnio. Desejando que Hdhel e Maadel reajam às provocações. Pois assim teria desculpa para leva-los despedaçados.
Hdhel já estava antevendo que não seria possível negociar com o abjeto, e começou a compartilhar os sentimentos de Maadel. Olho então para seu companheiro com um olhar que os dois já sabiam o que significava e disse para o Seu Joaquim. – Seu Joaquim! Dê alguns passos para trás. Procure ficar com as costas voltadas para a parede. E em hipótese algum, veja bem, em hipótese alguma, permita que algum ser abjeto o fixe no olhar. É assim que eles tomam conta de um corpo. Através dos olhos. Essa estória vai descambar para uma peleja violenta. – Hdhel levantou a cabeça olhando para o teto do galpão, e soltou um grito agudo altíssimo. E então, todos os seres que estavam invisíveis tornaram-se deléveis. Até mesmo Seu Joaquim podia agora visualizá-los. Muitos estavam pendurados no teto do galpão. Outros na parede fixos por ventosas. Mais alguns apareceram em volta dos dois que já estavam com Luiza. Quanto a anjos, não havia nenhum em forma humana. Hdhel e Maadel perceberam a presença de apenas quatro, mas esses eram anjos na forma de feras, como as que os atacaram antes, caçadores, e estavam mais ao fundo.
– Vocês não têm chance alguma. Dê-me uma oportunidade para demonstrar meu poder. Vamos lá passarinhos! Congelaram de medinho? – O abjeto de branco falou rindo e passando a língua bifurcada nos lábios.
– Por que você não tenta então. – Desafiou  Hdhel também com um sorriso. – Vai ficar um gosto amargo na sua boca.
– De três! Agoraaaaa! Ataque esses passarinhos! – Nesse instante desceram das paredes os seres com ventosas. Possuíam as mais diversas formas. Três que partiram para cima de Maadel tinham a forma de anfíbios, foram logo saltando em cima dele e rolaram no chão com ele. Maadel executa movimento giratório com o corpo deitado no chão, os braços em frente do rosto em forma de escudo. Vai girando deitado e ao mesmo tempo erguendo o corpo. Os abjetos que estavam grudados por meio das ventosas são projetados para longe contra a parede. Hdhel sofre um ataque mais duro. Um dos que estavam de pé, e que tinha a forma humana, salta e o atinge com os pés, e Hdhel é jogado ao chão. Para então, outros dois com ventosas saltarem sobre ele e com a língua projetada em forma de esporão, penetrarem no seu corpo. Hdhel grita novamente, mas desta vez de dor. Seu Joaquim estava perplexo. Nunca na vida teria imaginado tal visão. Demônios estavam atacando dois anjos, que embora caídos, até aquele momento só tinham realizado coisas boas. Apontou sua arma na direção de Hdhel e disparou dois tiros certeiros. Os seres que estavam sobre Hdhel receberam o impacto na cabeça. Rolaram para o chão expelindo uma gosma marrom.
Maadel e Hdhel ficaram de pé. Um ao lado do outro. Dessa vez, do teto caíram os abjetos que lá estavam pendurados. Possuíam a forma de símios. Cabeça grande e peluda, assim com o corpo, com presas protuberantes e afiadas. Já vieram urrando e saltando em sua direção, apoiados nos longos braços.
Hdhel e Maadel assumiram posição de defesa, e nesse momento, foram envolvidos por uma luz. O tempo parou. Literalmente dentro do galpão. Algumas feras que haviam saltado ficaram no ar. Outras ainda no chão com a boca espumando. Na mão direita de Maadel surgiu uma arma que era uma ponta metálica de cinquenta centímetros de comprimento. Projetava-se por cima do pulso e tinha um apoio na mão e na direção do cotovelo tinha uma peça de metal envolvendo o braço e dela saia pontas afiadas. Na sua mão esquerda tinha um escudo retângulo, de um metro de comprimento por cinquenta de largura, reto, que tinha no comprimento o desenho de Miguel com uma espada e no cento uma ponta de vinte centímetros. Um arco de um metro e meio surgiu na mão de Hdhel e em suas costas uma aljava carregada de flechas.
Então o tempo voltou a correr. Hdhel saltou para uma parte elevada do galpão e começos a desferir flechas sobre os seres abjetos. Cada vez que um era atingido desaparecia numa nuvem negra que também se dissipava. E a aljava nunca secava. Maadel recebeu o impacto de uma das feras simiescas sobre o escudo e foi projetado para a parede. Essa mesma fera salta sobre ele recebe uma estocada pela lateral do corpo. Inclina-se na direção de Maadel abrindo a boca, com a intenção de morder o rosto dele. Mas Maadel realiza um movimento com o braço direito, na qual a boca do símio abocanha o braço e nessa hora, as peças afiadas lhe atravessa a boca saindo pela cabeça. Maadel o empurra e sai correndo e desferindo golpes na direção das feras que não eram atingidas pelas flechas de Hdhel. Usava o escudo com a ponta para atingir alguns e penetrava outros com a arma da mão direita. Os dois apresentavam então habilidades incríveis. Saltando e rolando. Correndo de um lado para o outro. Atingindo as feras e os seres abjetos na forma humana. E o máximo que levavam eram arranhões. Seu Joaquim continuava atirando, percebeu que tiros na cabeça eram mais eficazes. Embora todas as criaturas alvejadas sempre se levantavam depois de um certo tempo, pois era necessário atingi-las com armas de luz.
O ser abjeto vestido de branco gritou bem alto. – Chegaaaaa! – Todos pararam. Até mesmo Maadel e Hdhel. Olharam na direção dele, que estava com Carlinhos nos braços e outro tinha uma faca no pescoço de Luiza. O momento era muito delicado. No início parecia que tudo estava sob o controle dele. E de repente parecia que os “passarinhos” estavam virando o jogo. “Mas agora não!” Pensou ele. “Vou acabar com esses dois passarinhos agora!” Um dos abjetos em forma humana pulou na direção do Seu Joaquim e acertou com as garras na barriga, jogando-o no chão.
– Virão passarinhos? Pensam que podem acabar com tudo? Seu amiguinho já levou a pior. Agora são esses dois aqui! Uma palavra minha e ela perde a cabeça e o pequenino vai ser minha refeição!
Hdhel se vira e observa Seu Joaquim caindo ao chão e escuta as palavras do abjeto. Nesse instante ele abre os braços, grita novamente de forma ensurdecedora. Uma luz mais ofuscante brilha por todo seu corpo. O tempo para. Então, um par de asas azuis enormes crescem em suas costas. No mesmo instante sua aparência se transfigura. Fica com dois metros de altura e volta a ficar sem cabelos como no início. Surge uma armadura preta e vermelha no lugar das roupas que usava. Em sua mão esquerda uma espada com duas lâminas de trinta centímetros, cada uma indo em direção oposta assim como fio das espadas. O tempo volta a correr. Hdhel com um movimento da mão direita faz com que o abjeto que tinha Luiza dominada simplesmente evapore em uma nuvem negra. E com um gesto apenas, Carlinhos surge em sua mão.
– Hdhel! Irmão! Já estava na hora desse exterminador que vive em seu interior aparecer! – Grita Maadel.
– Ora, ora, ora! Então o passarinho é na verdade um anjo exterminador! Sempre quis saber a extensão dos poderes de um exterminado. Venha aqui penoso! Deixe-me arrancar essas suas novas asas!
Sem dizer uma palavra Hdhel entrega Carlinhos para Maadel e salta até o abjeto, desferindo um golpe com a perna que faz com que ele atravesse todo o galpão e choca-se contra a parede.
– Não vai ser assim tão fácil passarinho! – Então o ser abjeto cresceu. Ficou com dois metros e meio de altura. No lugar dos cabelos escamas eriçadas e o rosto vermelho. Usava uma armadura negra. E em sua mão direita uma espada. Correu na direção de Hdhel e desferiu golpes com a espada que foram rebatidos pela arma de luz. Hdhel soca o ser abjeto no rosto e esse recua alguns metros. Desmaterializa-se e surge atrás de Hdhel e o atravessa pelas costas. Num segundo Hdhel desaparece e ressurge com a espada no pescoço do ser abjeto, que sorrir e diz sorrindo: – Muito bem passarinho! Você acha que pode cortar minha cabeça? Vai em frente! Tente! – Hdhel simplesmente toca o ombro do ser abjeto e esse volta para a forma humana de antes. – Como você fez isso? – Hdhel ergue o braço direito do abjeto e com a espada, decepa bem no cotovelo. Então o ser abjeto dar dois passos para trás com o braço sangrando um líquido negro. Assustado, ergue o braço esquerdo e some juntamente com os demais que restaram.
– Graças a Deus! – Gritou Maadel e então Hdhel volta para a forma humana. Mas suas asas permanecem. – Ei! Não é justo! Você tem asas novamente! – Maadel coloca Carlinhos no berço e Hdhel caminha até ele e toca o ombro e asas crescem nele. Os dois se abraçam sorrindo. Maadel vai socorrer Seu Joaquim e Hdhel coloca Luiza em seus braços toca sua cabeça e ela abre os olhos.
– Agora estou morta e fui para o céu com meu anjo da guarda! – Ela fala sorrindo e tocando as asas de Hdhel. – Que lindas! Cresceram novamente?
– Agora está tudo bem! Eliminei qualquer traço do abjeto que estava em você. Consegue se levantar? Tem um menininho ali esperando por você. – Hdhel então ajuda Luiza se levantar e apoia na caminhada até o berço.
Maadel toca na ferida aberta na barriga de Seu Joaquim, que estava acordado e viu toda cena e no mesmo instante cicatriza. – “Nem murmureis, como alguns deles murmuraram e foram destruídos pelo exterminador”[15]. Gloria ao Senhor! E ao seu exército de anjos! – Clama Seu Joaquim. Vocês são maravilhosos! Vejo anjos caminhando na Terra e sinto a presença de meu Senhor.
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Estavam de volta ao sítio, Luiza conversava com Seu Joaquim na sala após alimentar e colocar Carlinhos para dormir. Sentido a ausência da dupla salvadora, levantam-se e saem da casa para procura-los. Encontram Hdhel e Maadel fitando a copa do vigoroso ipê do centro do pomar. Os dois estavam serenos e com um leve sorriso no rosto. Não estavam mais ostentando suas asas para não chamar atenção indevida. Luiza os chamou mais não responderam. – Venha aqui Seu Joaquim, sentemos ao pé da arvore. – Ali ficaram mais meia hora admirando aquela cena, vez ou outra fazendo algum comentário sobre os eventos por quais passaram. Uma vez que Luiza nada lembrava, Seu Joaquim a atualizava os eventos ocorridos. Então os dois despertaram sorrindo.
– E então? Vão nos contar o que se passa ou não? – Perguntou Seu Joaquim.
– Nós nunca deixamos de sermos anjos! Embora tenhamos caído na Terra. Apenas não ouvíamos mais a voz. Mas agora até isso recuperamos. – Falou empolgado Maadel.
– E o que ouviram afinal? Estavam ai olhando para cima com olhar vidrado e sorriso no rosto. Alguma coisa muito boa vocês ficaram sabendo. – Fala Luiza muito feliz.
– Ele está feliz conosco! Agimos bem! Mas não podemos retornar para o Infinito Superior. Devemos permanecer aqui e continuar com nossa tarefa. Temos muito por fazer. Os homens precisam de orientação e ajuda. Outros como nós já estão aqui. Poderemos precisar deles a qualquer momento. Foram deixados sobre nossa responsabilidade. Os abjetos estão em toda parte e vocês humanos necessitam da nossa orientação. Temos que agir conforme os desígnios de Deus. Então Seu Joaquim de mãos postas olhou para o céu e disse: – “Bendizei ao Senhor, todos os seus anjos, valorosos em poder, que executais as suas ordens e lhe obedeceis à palavra.”[16]



[1] Romanos 11:33
[2] João 14:6
[3] Lucas 11:2-4
[4] Lucas 11:9-13
[5] Salmo 103:20
[6] A biografia de Padre Cícero pode ser encontrada em: http://www.viagemdeferias.com/fortaleza/ceara/padre-cicero.php
[7] 2 Timóteo 4:7 – “Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé”
[8] GUIAJUANORTE. Monumento ao Padre Cícero é maior símbolo do Ceará aos olhos do mundo. Disponível em: <Juanortehttp://www.juanorte.com.br/guiaestatua.html> Acesso em: 01 mar 2013.
[9] Tiago 4:3.
[10] Eclesiástico 3:1-8.
[11] Salmos 90:4.
[12] Pedro 3:8-9.
[13] Mateus 17:20.
[14] ARMANDINHO / KBOING. Anjo do céu. Disponível em: http://www.kboing.com.br/musica-e-letra/armandinho/41486-anjo-do-ceu/ Acesso em: 02 mar 2013.
[15] 1Coríntios 10:10.
[16] Salmo 103:20